19 de janeiro de 2010

Resenha: Por que (não) ensinar Gramática na Escola

A obra é dividida em duas partes: na primeira Possenti (1996) apresenta várias teses fundamentadas e justificadas. Na segunda, discorre sobre o conceito de gramática, apresentando a classificação e o conceito de cada subdivisão e abordando sobre regras, erros e atitudes comuns dos usuários de uma língua.


Preliminarmente, o autor defende o princípio de que “o objetivo da escola é ensinar o português padrão”. Mostra duas teses que negam esse princípio: uma de ordem político-cultural, que alega ser uma violência impor a um grupo social os valores de um outro grupo, além de destruir ou diminuir valores populares: outra de natureza cognitiva que pré-supõe de um único dialeto para cada grupo e para cada falante. Tais teses são contestada sob o fundamento de que além de ser relativamente fácil aprender outro dialeto, os menos favorecidos socialmente só têm a ganhar com o domínio de outra forma de falar e de escrever.

O fracasso na consecução desse objetivo podem ser de ordem metodológica ou decorrente de valores sociais complexos, que em parte podem ser resolvido na própria escala, bastando para isso ter uma concepção clara do que seja uma língua e do que seja um ser humano do ponto de vista do ensino/ aprendizagem, tendo em mente que o homem é diferente do animal, embora haja uma certa intersecção, há certos Comportamentos que poderíamos chamar de criativos, visto que não dependem de repetições, mas de hipóteses constantemente propostas e testados pelo próprio aprendiz. Como exemplo temos crianças e o que aprendem sobre a língua sem sequer ter tempo de ser treinada.

É comum a justificativa de que uma língua é muito difícil por conter muitas regras e exceções. É um equivoco, já foi provado, mediante análises de várias línguas indígenas que não existem línguas simplificadas, ou seja, primitivas. Hoje sabemos que todas as línguas são estruturadas de igual complexidade. Não são nem simples nem complexas são apenas diferentes. O mesmo argumento é válido para a comparação entre os dialetos de uma mesma língua (populares e padrão), cuja distinção se faz pelos aspectos e não pela complexidade das respectivas gramáticas.

Os grupos que falam uma língua ou um dialeto em geral julgam, a partir da sua fala, a fala dos outros e consideram a diferença como um erro especialmente quando se trata de falante da mesma língua. Não se dão conta de que todos que falam sabem falar.

Quase sempre ouvimos dizerem que alunos cidadãos não culto é que falam errado. Pode ser que falem errado, porém mais errado é pensar que falam tudo errado. O que acontece é a ocorrência de características que nos chamam atenção e que estamos acostumados a chamar de erros. (Na realidade falamos mais correto do que pensamos.)

Transportando as observações de LABOV para o problema da língua portuguesa pode-se dizer que há “erros” que chocam e “erros” que não chocam. Uma das formas é comum, já que falantes de todos os grupos sociais a utilizam. A outra distingue falantes por ser utilizada apenas por certos grupos.

Assim como não existem línguas fáceis ou difíceis, não existem também línguas uniformes e imutáveis. Todas as línguas variam e essa variedade é o reflexo da variedade social, cuja diferenças se deve a fatores internos e externos a língua que a condiciona. Da mesma forma todas as línguas mudam. O modelo padrão de hoje pode ser o arcaísmo de amanhã. Uma ou outra forma (arcaica ou padrão) não são erradas, todavia o ensino de português teria muito a ganhar se a escola propusesse como padrão ideal de língua a ser atingidos pelos alunos a forma de textos atuais, ao invés de textos de literatura antiga.

Aprender uma língua ainda é considerado um “mistério” do ser humano, levando-se em conta a velocidade que aprende a falar. O que se sabe é que todos falam muito bem a partir dos três anos de idade. E por mais efetiva e constante a convivência com os adultos e outras crianças, não há nada que se assemelhe a um ensino formal. O que se observa nessa aprendizagem informal é o uso efetivo e contextualizado da linguagem dando sentido a tudo que se diz. Importante notar que no processo de aquisição fora da escola há correção, mas, não existe reprovação, humilhação, castigo etc. A escola poderia conseguir essa eficácia imitando da forma mais próxima possível ou atividades lingüísticas da vida.

Interessante enfoque dá, autora ao que se denominou de “receita” para estipular programas de ensino para a língua materna nos diversos anos escolares (ressalvando a Alfabetização) Consubstanciada no seguinte princípio: “O que já é sabido não precisa ser ensinado”. Nesta mesma linha de pensamento sugere levantamento escolar que lhe daria condições de saber o que lhe cabe no ensino do padrão e o que os alunos aprendem fora da escola. Tudo isso nada mais seria do que uma mera imitação das atitudes dos adultos com as crianças, ou seja, ensinar apenas quando os alunos erram.

Tudo que foi exposto só terá sentido se ficar claro que conhecer uma língua é diferente de conhecer sua gramática, sendo necessário distinguir seu papel do papel da escola – que é ensinar língua padrão.

Por fim, apegando-se ao objetivo de dominar a variedade padrão de uma língua e tornar os alunos leitores e autores razoáveis, o ensino da gramática é completamente desnecessário, sendo certo que, seja qual for a modificação das escolas, as únicas pessoas que podem encarar esse trabalho são os professores e alunos.

A segunda parte estabelece a diferença entre ensinar língua e ensinar gramática. Ensinar língua é tentar consolidar o uso de uma variedade de prestígio ao passo que ensinar gramática justifica-se por razões culturais (Perini).

Neste tópico trava-se uma discussão sobre o polêmico conceito de gramática elegendo-se a expressão “Conjunto de regras” para a partir dessa distinguir os vários tipos de gramática.

Gramática normativa – Conjunto de regras a serem seguidas. Usadas nas gramáticas pedagógicas e nos livros didáticos, cuja finalidade é ensinar os leitores a “falar e escrever corretamente” incluindo nesta o emprego da variedade padrão.

Gramática descritiva – Conjunto de regras que são seguidas, cuja preocupação é descrever e/ou explicar as línguas como elas são faladas. Neste parágrafo fica claro a distinção entre regras a ser seguidas e as que são seguidas, tendo em vista que as regras a serem seguidas podem continuar propondo regras que os falantes não seguem mais em conseqüência do princípio da mutabilidade das línguas. Temos como exemplos: as segundas pessoas do plural, os futuros sintéticos e o mais que perfeito simples; Destaca-se também notáveis diferenças no sistema pronominal “vós”, a forma usada é “você” o(s) e a(s) por ele(s) e ela(s) e “nós” por “agente”.

A preocupação da gramática descritiva não é apontar erros, mas constatar que essas formas existem e são utilizadas por pessoas de grupos diferentes e em situações diferentes. Consta-se ainda uma resistência por não ser formas usadas pelas pessoas cultas, o que leva a perceber que o critério de correção é social e não lingüístico.

Gramática internalizada – Conjunto de regras que o falante domina. Refere-se a hipóteses sobe aspectos da realidade mental dos mesmos falantes, isto é, dada a maneira constante (que se repete) as pessoas identificam frases como pertencendo à sua língua, produzem e interpretam seqüências sonoras com determinadas características, supondo que há um conhecimento mental específico, (lexical e sintático semântico) que garantem esta estabilidade.

Há dois tipos de fatos lingüísticos que fundamentam a existência de uma gramática mental que são: as formas regularizadoras de formas irregulares, nela as crianças aprenderam (por repetição) regras de conjunção verbal e aplicando-as produzem tais formas; e as hiper-correções, onde falantes do meio rural ou de pouca instrução produzem formas que desviam da padrão e quando aprendem a forma padrão aplicam as regras criando outras formas.

As regras são abordadas nos sentidos de obrigação regularidade e constância, correspondendo respectivamente às regras de gramática normativa e às regras da gramática descritiva.

Quanto à gramática internalizada, as regras expressam conhecimentos semânticos.

A cada definição de gramática corresponde uma concepção diferente e compatível de língua. O mesmo ocorre em matéria de erro que será diferente para cada definição.

Finalizando a obra, no tópico, esboço prático Possenti (1996) sugere uma metodologia para o ensino de gramática sem desviar do objetivo da escola. Enfatiza a gramática internalizada. Destaca a necessidade de uma constante exposição do aluno ao maior número possível de experiências lingüísticas na variedade padrão e sua adequação às situações, não excluindo a tarefa de reflexão sobre a linguagem, sem contudo, cair num círculo vicioso e levar para a sala de aula questões artificiais, ou seja, substituir os manuais de análise sintática por listas de expressões e modas de dizer das mais variadas formas. Aborda também a questão dos “erros escolares” onde transcreve sobre o domínio progressivo da variedade padrão e analogia reais. Em seguida expõe uma proposta de ensino gramática que consiste num trabalho envolvendo as três modalidades de gramáticas em ordem de prioridade inversa em relação à ordem de sua apresentação, privilegiando respectivamente cada uma, numa espécie de gramática Comparativa.

Mostra, expondo exemplos, que não existem propriamente textos errados e textos corretos, o que ocorre é uma questão de adequação ou inadequação.

Fecha a obra dizendo que o ensino deveria subordina-se à aprendizagem e não ao professor.

POSSENTI, S. Por que (não) ensinar Gramática na Escola. Campinas: Mercado de Letras/ALB, 1996.
 
 
Geralda Luiza da Silva da Cunha 168.558
Cibele Aparecida Brandão 163.369
Joyce Cristina Leme Gomes 163.388
Daniela Feitosa de Sousa 170.385


Língua Portuguesa A - Sintaxe - Letras - Prof. Dr. José Miguel Mattos - UBC

Nenhum comentário:

Postar um comentário